terça-feira, 10 de novembro de 2009

O Curioso Caso da Nova Tomada Brasileira – Uma Análise Crítica e Alternativa (mais eficiente) para sua Implementação



A partir do primeiro dia de 2010, em conformidade com Norma Brasileira NBR 14.136, todos os aparelhos eletrônicos fabricados ou comercializados no Brasil serão obrigados a seguir o padrão imposto pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).
Quero demonstrar neste artigo como esta imposição causará um enorme incômodo e uma perda bilionária ao bolso de milhares de brasileiros e como poderia ser uma implementação muito mais eficiente, com maiores benefícios e com ônus minimizado à população.
Após estudos “avançados” que se arrastaram por mais de 20 anos, a ABNT mostra a sua grande obra de arte: as inovadoras tomadas e plugues hexagonais de 10 e 20 amperes que vocês só encontrarão em solos tupiniquins:

 

 
Segundo a ABNT e ABINEE (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), este novo formato traz as seguintes super vantagens para você e toda sua família:
1.       Maior segurança – principalmente para seu pimpolho curioso e/ou descuidado
2.       Padronização dos plugues e tomadas
3.       Preços equivalentes com as tomadas e plugues usados atualmente
4.       Compatibilidade com 80% dos plugues utilizados atualmente


Vamos à analise passo a passo deste curioso caso indicando melhorias em sua abordagem e implementação. Adiciono também alguns conceitos relevantes para novas implementações.


1. Nomeie o(s) problema(s) - As chances de você conseguir resolver um problema é muito maior se você identificá-lo corretamente.
Neste caso, temos dois problemas relevantes (em ordem de importância):
Problema 1: Falta de aterramento nas casas e edifícios – sabe aquele cabinho que vem solto no microondas e na geladeira que você, na melhor das hipóteses, amarra em um parafuso qualquer na parede achando que está aterrando alguma coisa? E aqueles equipamentos com o terceiro pino que você simplesmente arranca ou usa um adaptador porque em sua casa não tem a tomada com o terceiro pino e, tão pouco, um aterramento que preste?
O aterramento é importante para proteger tanto os equipamentos contra as variações de tensão de uma rede elétrica, quanto as pessoas contra choques (em alguns casos).
Problema 2: Choques elétricos – o terror de todos os pais do planeta e o grande argumento da ABNT para a mudança de padrão. Levando em consideração que o comportamento humano é regido sob recompensa e punição, acho que todos nós aprendemos desde a tenra idade (e muito rápido) que não se deve brincar com tomadas. Enfiar a chave de fenda na tomada? Não não não! E aquele grampo que caiu do bobe da vovó Matilde antes de ir à feira? Na na ni na não! Aqueles cabides bonitos de arame então pode ser? Também não!
Adianta falar e avisar? Também não! :)  Na idade das fraldas, tudo que está à mão ou vai para a boca ou faz uma... ou no máximo duas expedições para o chocante mundo elétrico. E todos nós convivemos com isso.
E os coitados dos plugues e tomadas que usamos atualmente... o que têm a ver com esses problemas? Antes de levá-los à fogueira e culpá-los pela crise financeira e pelos traumas de infância do seu pimpolho, vamos ao segundo ponto de nossa análise.  


2. Diminua o custo de troca para a nova solução:
As análises otimistas da ABNT assumem que 80% das tomadas atualmente são compatíveis com o novo padrão. Na tabela a seguir temos os 20% (na melhor das hipóteses) das situações em que você terá que preparar o seu bolso e sua paciência com as novas tomadas e plugues da ABNT:


Preço médio de uma tomada elétrica ou adaptador: R$ 7,00
Quantidade média de eletrodomésticos que precisarão de um adaptador ou nova tomadas nas residências/ escritórios no Brasil (estimativa): 6
Quantidade de residências e escritórios no Brasil (estimativa): 45.000.000
Mudar as tomadas e plugues para o padrão do ABNT: TEM PREÇO e é muito caro: R$ 1,89 bilhões (fora o serviço de eletricista)... “Têm coisas que só a ABNT deixa de fazer por você”.
=============================================================
Fica evidente que o custo de troca não foi levado em consideração na determinação deste novo padrão, repassando todo o ônus para 100 milhões de brasileiros (população economicamente ativa - PEA).
Existem diversas histórias sobre adoção de padrões no mercado. Uma exemplar, em que o custo de troca coletivo também é enorme, como das novas tomadas, é a história dos teclados que utilizamos até os dias de hoje. Este padrão é chamado de QWERTY (primeiras seis letras do teclado) e foi idealizada em 1873 para que os datilógrafos não fossem rápidos demais a ponto de engavetar as teclas da máquina de escrever.
Em 1932, foi apresentado o teclado com o padrão Dvorak (nome de seu inventor). Dvorak e meia dúzia de seguidores defendiam que seu novo layout/ padrão era infinitamente melhor e mais eficiente que o teclado QWERTY. Porém, a curva de aprendizagem necessária para gerar uma massa crítica de usuários é tão grande que, atrelado ao padrão QWERTY adotado mundialmente, inviabiliza essa opção.
Imagine se a ABNT resolve mudar todos os teclados vendidos no Brasil, defendendo que seremos mais eficazes e teremos menos problemas relacionados a LER (Lesão por Esforço Repetitivo) ou STC (Síndrome do Túnel do Carpo)?
Teclado com o padrão Dvorak (Idealizado em 1932):



Mesmo este layout sendo uma opção de configuração do Windows atualmente, ninguém sabe de sua existência e, assim como no caso das novas tomadas e plugues, ninguém percebe nenhuma vantagem em utilizá-lo.




3. Posicione o seu produto
O posicionamento de produtos que detalharemos abaixo é decorrente do custo de troca.
Quando um padrão está sendo adotado, é importante posicioná-lo  em uma matriz de compatibilidade de produtos evolutivos X performance de produtos revolucionários.
Um produto revolucionário oferece ganhos evidentes de funcionalidade e/ou performance para os consumidores sobre o padrão anterior. Exemplo disso é a adoção do CD como mídia. A conveniência, durabilidade e qualidade de som do CD justificaram a troca e o custo de substituir as músicas antes armazenadas em LP e K7.
Já produtos evolutivos oferecem um menor custo de troca, porém com ganhos menores de funcionalidade e/ou performance. Exemplo disso são as TVs digitais – HDTV que são compatíveis com os sinais tradicionais de baixa resolução das TVs antigas e o leitor de mídias Blueray que é compatível com mídias anteriores do DVD e CD.
O gráfico abaixo demonstra qual o erro de posicionamento da ABNT: Impor um novo padrão sem  oferecer nenhuma funcionalidade revolucionária ou valor percebido pelos consumidores e, mesmo assim, exigir um custo de migração com uso de adaptadores, novas tomadas e novos plugues.




  1. Considere outras abordagens / soluções que facilitem a vida dos consumidores
Como poderia ser o posicionamento da ABNT para oferecer uma solução de maior valor percebido e sem ônus elevado aos brasileiros? Ela já existe!  Vejamos abaixo:
-       Prever, fiscalizar e garantir que as novas edificações (casas e edifícios) tenham aterramento. Isso já é obrigatório e realizado desde 2006, em conformidade com a lei federal 11.336 e sob a supervisão do CONTRU (Controle do Uso de Imóveis) e  Procobre (Instituto Brasileiro do Cobre).
-       Adotar o padrão universal de tomadas. Este padrão garante compatibilidade muito maior com as tomadas utilizadas atualmente no Brasil, além de ser compatível com outros eletrodomésticos e tomadas utilizadas em outros países, reduzindo significativamente o custo de troca / adoção apenas para as tomadas de ar condicionado e lava-roupas. 



-   UTILIZAR O DISJUNTOR DIFERENCIAL REFERENCIAL (DR)  EM TODAS NOVAS EDIFICAÇÕES. É incrível, mas estes disjuntores já estão há mais de 30 anos no mercado e ninguém os conhece. Sua função: EVITAM CHOQUES E INCÊNDIOS. Isso mesmo!!! Não é preciso inventar novos padrões de tomadas... novos modelos.... novos adaptadores para evitar choques. Antes mesmo de você sentir o choque, estes disjuntores se desarmam e sua utilização já é previsto como norma da própria ABNT (NBR 5410) desde 2004. Assim como o aterramento, deveria ser obrigatório em todo território nacional!





-       Este disjuntor tem o preço entre R$ 40,00 e R$ 120,00 variando de acordo com a sensibilidade, amperagem e quantidade de pólos. Este preço sobre uma nova edificação fica totalmente diluído, podendo ainda ser incentivados com a redução de impostos ou mesmo subsídio de modelos destinados à edificações populares que utilizariam apenas um disjuntor DR por edificação.


Através desta abordagem, os consumidores teriam, de forma mais gradual, muito mais segurança contra choques e incêndios além de minimizar a chateação e ônus de comprar novas tomadas, plugues e adaptadores que não tem nenhum  valor percebido. 
E o que torna este caso tão curioso? É como a ABNT conseguiu levar adiante sua idéia e abordagem tão questionáveis e ainda impor desta maneira à toda população brasileira. Alguém ganha com isso... e não são os consumidores.

Textos Complementares:



Crítica à ABNT: A ABNT VENDE cada norma técnica, mesmo em formato digital, a preços nada acessíveis.
Norma NBR 14136 a R$ 65,00
Norma NBR 5410 a R$ 165,00
R$ 230,00 para obter digitalmente as normas básicas de instalação elétrica de uma Associação que deveria ter como prioridade a disseminação e prática das mesmas: TEM PREÇO e é MUITO CARO...”Têm coisas que só a ABNT deixa de fazer por você
======================
Fontes:Sites ABNT, ABINEE, Siemens, Interpower, revista Veja, opiniões espontâneas e Claudio Silva que já sabia da existência dos disjuntores DR